Sobre a Originalidade do Músico*

*Escrito para o jornal Tijuca em Foco

A verdade é que os músicos de certa forma são uma fraude. Calma, isso não é uma louca acusação, o fato é que todos recebemos influências do ouvir musical que é transportado para o fazer musical.

É uma espécie de criptomnésia, uma memória inconsciente e oculta. O escritor português João Pereira Coutinho em um interessante artigo na Folha de São Paulo[1] também discorre sobre o assunto. Segundo ele, a originalidade não existe e segundo Oliver Sacks[2], essa tal “criptomnésia” é fundamental no processo criativo.

“Paradoxalmente, criamos porque esquecemos. E esquecemos, de forma ainda mais paradoxal, o que a nossa memória registrou como significativo para nós: um reservatório de conhecimentos ou encantamentos onde iremos voltar um dia –anos depois, décadas depois– para construir as nossas “originalidades””. (Coutinho, 2013)

Muitos músicos não tem dimensão do quanto são importantes as influências musicais na sua produção sonora. Nossa originalidade é provocada pelo processamento de todas as informações que recebemos e absorvemos diariamente. Neste ponto, entra a importância para o músico, de ter excelentes referências musicais. Não é muito raro ouvir pessoas dizendo a um músico: “Você está soando parecido com fulano”, “O estilo de sua música está uma mistura de sicrano com beltrano”. Essa mistura é natural e faz parte do processo de formação da identidade.

Também é importante destacar que expandir fronteiras é  fundamental nesta formação. Para um jazzista, por exemplo, existem grandes referências como Miles Davis, Bill Evans, Dizzy Gillespie e John Coltrane, mas é importante que este músico amplie seu horizonte conhecendo referências em outros estilos, como B.B. King no blues, Mike Stern no jazz/fusion contemporâneo, Tom Jobim na bossa-nova, J.S. Bach no barroco e assim por diante.

Absorver linguagens e incorporá-las ao seu fraseado e ao seu modo de arranjar as músicas é uma jornada longa e prazerosa. Como andam suas referências? Se você é músico, a resposta a esta pergunta pode ser fundamental no desenvolvimento de sua identidade musical.

RAMON CHRYSTIAN DE A. LIMA
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NOTAS

[1] Coutinho, João Pereira. A originalidade não existe. Folha de São Paulo on line. 2013
Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/colunas/joaopereiracoutinho/1240373-a-originalidade-nao-existe.shtml>

[2] Doutor Neurologista, escritor. Professor de Neurologia e Psiquiatria na Universidade de Columbia, EUA.

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Ramon Chrystian
Ramon Chrystian é ministro de música e adoração, formado em música sacra pelo Seminário Teológico Batista do Sul do Brasil (STBSB/RJ - FABAT), estudou guitarra elétrica na Faculdade Santa Cecília -SP, Conservatório Brasileiro de Música - RJ e Starling Academy of Music. Consagrado ao Ministério de Música na Igreja Batista Itacuruçá - Tijuca -RJ, atualmente é ministro de música na Terceira Igreja Batista de Cabo Frio/RJ. Autor do livro: Ministério de Música: Tensões na Liderança e a Renovação Pessoal. Ministra palestras em diversos congressos no Brasil tratando de temas como a elaboração de arranjos, guitarra elétrica e louvor e adoração. Como escritor colaborou com as revistas Louvor, Diálogo & Ação, o Embaixador. Colunista do jornal Tijuca em Foco, site Prazer da Palavra (Israel Belo de Azevedo) e Guitar Battle. Mantém o Blog www.letrasonora.com.br onde escreve periodicamente sobre música e adoração.

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